Guia Completo De Como Fazer Análise De Gema Da Videira

A análise de gema é uma ferramenta que o viticultor dispõe para o orientar na tomada de decisão no momento da poda de produção.

Para aqueles que não tem muita experiência com a cultura da videira, você deve está se perguntando, que tipo de análise é essa? ou como isso é feito? Respondendo seu questionamento, a análise de gema é um procedimento laboratorial que serve para determinar a quantidade de gemas necessárias nos ramos e nas plantas para obtenção da produtividade desejada, bem como, fornecer informações sobre a qualidade das gemas da área, como  à presença de gemas escuras ou mortas. Essas informações juntas servem para orientar o viticultor a estimar o número de cacho que terá na área, e, consequentemente a qualidade dos cachos e produtividade estimada.

Para facilitar a sua compreensão sobre o assunto, irei descrever alguns conceitos básicos sobre algumas parte da videira que são importantes para entendermos melhor o assunto. Então, vamos conhecer as partes que compõe o ramo de uma videira. Ramos são as partes lenhosas das plantas, e estes são muito importantes para o agricultor. Nesses ramos estão presentes as gemas que são dispostas ao longo dos ramos, e geralmente são rodeadas pelo pecíolo da folha. As áreas lisas dos ramos entre uma gema e outra são chamados de entrenós.

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Figura 1: Composição do ramo da videira.

Morfologia da gema:

As gemas da videira são geralmente classificadas como mix de gemas, isso porque tanto folhas, flores e frutos são desenvolvidas no mesmo local. Uma gema é composta por: uma gema primária, que normalmente produz um ou mais fruto; uma gema secundária, que produz até um terço dos frutos; e uma gema terciário, que produz pouco ou nenhum fruto. Juntas, essas gemas são cercados por escalas (brácteas) que serve de proteção durante a fase de dormência. As gemas secundária e terciárias se desenvolvem (brotam) quando ocorre algum dano na gema primária (morte da gema por condições climáticas, inseto ou dano mecânico),  que dão origem aos brotos que podem ser férteis.

Embora possa ocorrer o desenvolvimento das gemas secundárias ou terciárias, isso não garante ao produtor uma colheita com o mesmo potencial que se esses cachos fossem gerados pelas gemas primárias. Isso ocorre porque as duas gemas remanescentes (secundária e terciária) normalmente não são tão frutíferas como a gema primária. Isto é especialmente evidenciado na cultivar Thompson Seedless e em algumas cultivares sem semente, a exemplo, a Flame Seedless. Muitas cultivares de uva de vinho e suco, por outro lado, tendem a serem mais frutíferas tanto nas gemas primárias quanto nas gemas secundárias.

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Figura 2 – Seção transversal de gema dormente mostrando a composição de uma gema e danos internos nas gemas. Foto: Lynn Mills

As gemas podem serem classificadas pela sua natureza (frutífera ou vegetativa), bem como, pela sua localização no ramo, podendo ser axillaires (quando estão localizadas nas axilas das folhas), latentes (quando permanecem inativa indefinidamente e estão localizadas na madeira) e gemas basilares ou “cegas” (quando situam-se na inserção do ramo com a madeira velha).

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Figura 2 – Classificação da gema pela posição na planta.

A dormência da gema primária geralmente inibe o desenvolvimento das gemas secundárias e terciárias. Quando ocorre o desenvolvimento da gema primária, é possível visualizar através do microscópio um primórdio de cacho. A figura abaixo mostra a diferença de uma gema vegetativa e uma gema frutífera.

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Figura 3: Seções transversais mostrando a diferença de uma gema vegetativa e uma gema frutífera de uma gema. Foto: Roberto Anastácio.

O conhecimento da posição das gemas férteis para cada variedade é de fundamental importância na definição do tipo de poda a ser empregada no vinhedo.

A fertilidade das gemas é influenciada pela posição da gema no ramo, e isso está diretamente relacionado à sua exposição a luz solar. Em algumas variedades as gemas basais tendem a apresentar baixa fertilidade quando comparada as gemas medianas. Um estudo realizado pela Universidade de Davis com a variedade Thompson Seedless demonstrou que a melhor fertilidade das gemas estão nas posições de 7º a 13°. A fertilidade de gema na posição basal (três gemas) é menos da metade que a fertilidade encontrada nas posição 7° a 13° gemas.

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Figura 3: Percentual gemas férteis x posição da gema no ramo

Como é feito este tipo de análise?

Para fazer uma análise de gema, você vai precisar de lâminas (bisturi), um estereomicroscópio ou microscópio, uma tesoura de poda, e um notebook ou computador para documentação.

O primeiro passo para análise de gema começa como a coleta do material. A época ideal para colher a amostra é durante o período de repouso. Na região do Vale do São Francisco os produtores realizam essa análise 15 dias antes da poda de produção.

Coleta da amostra:

A precisão desta análise depende principalmente do produtor na retirada da amostra de ramos bem uniforme e representativo com a real situação da área. A amostra deve ser retirada de um lote que apresenta uniformidade das plantas (mesma data de poda de, cultivar copa, porta-enxerto, idade das plantas e tipo de solo).

Segue abaixo a metodologia de retirada de amostra desenvolvida pela Embrapa.

  • Para coleta da amostra utiliza um caminhamento na área em forma de Z. Esses ramos serão retirados de 15 plantas escolhidas aleatoriamente na área. Evitar retirar ramos de plantas que estão nas bordaduras da área.
  • Cada amostra deve ser composta por 15 ramos com 15 gemas, sendo estes ramos maduros e com boa sanidade. Esses ramos serão retirados de três partes da copa da planta: basal, mediana e apical;
  • Deve-se coletar os ramos garantindo a integridade da 1ª à 15ª gema, eliminando as folhas cuidadosamente; amarrar todos os ramos no mesmo sentido em feixe; acondicionar os ramos em sacos plástico para evitar a desidratação das gemas e identifica-los em seguida por: produtor, parcela, variedade, porta enxerto e telefone;
  • Se o material tiver netos estes deverão ser separados dos ramos com cuidado para não danificar a primeira gema, selecionando 30 netos com 3 gemas, exceto a Thompson que deverá ter 5 gemas e em seguida acondicioná-los em saco plástico;

Fazendo a análise:

Esta análise é feita com auxílio de um microscópico ou lupa binocular de aumento de 30 vezes e um bisturi, no qual são feitos cortes no sentido transversal na gema/olho até que seja possível identificar ou não a presença de primórdio de inflorescência (cacho), no qual apresenta aspecto de um cacho de uvas em miniatura.

Todas as gemas do ramo devem serem analisadas cuidadosamente utilizando lâmina de bisturi. Para fazer esta análise você deve fazer cortes finos na superfície da gema, de forma cautelosa para não danificar o primórdio de inflorescência (cacho). Conforme aprofundando os cortes será possível visualizar a presença ou ausência de primórdio de inflorescência (cacho). Cada  cacho encontrado deve ser marcado na planilha na posição exata em que o mesmo foi encontrado. Você idenficia a presença do primórdio de inflorescência (cacho) através do estereomicroscópio.

 

Onde fazer esta Análise?

Este tipo de análise é feita em laboratórios ou por profissionais capacitados. Laboratórios que oferecem outros serviços (ou seja, análise nutricional) também podem realizar análise de gema. Se você não consegue encontrar um laboratório que oferece esse serviço, você pode treinar alguém da sua equipe de trabalho.

Caso tenha interesse em treinar alguém da sua equipe. Entre em contato conosco enviando um email para: vittisbrasil@gmail.com .

Como os resultados são apresentados??

O resultado é apresentado através de uma planilha que demostra o tipo de cada gema em cada posição no ramo. Na tabela, os cachos (gemas férteis) são representados pelo número 1, as gemas sem frutos (gemas vegetativas) pelo zero, as gemas escuras pela letra “E” e as gemas mortas pelo “M”.

Numa segunda tabela, é possível verificar essa concentração de gemas férteis em percentual, pois a tabela demonstra onde há a maior predominância de primórdios de inflorescência, ou seja, é possível visualizar em quais gemas há uma maior concentração de cachos.

E na última tabela temos uma correlação entre o número de gemas por ramo e número de ramos por planta que estima o número de cachos por planta numa condição perfeita, ou seja, sem considerar erros de amostragem, erros de análise e com 100% de brotação. A nível comercial, o percentual de 70% é considerável um bom resultado.

Beneficios de realizar esse tipo de análise:

O principal objetivo da análise de gema é ajudar os produtores a decidir o número de gemas e ramos que serão deixados no momento da poda. Alguns serviços de análises também avaliam os tamanhos dos primórdios de inflorescência (cachos), assim eles podem sinalizar ao produtor a qualidade dos cachos (tamanho).  Algumas pessoas que trabalham realizando esse serviço classifica o tamanho do primórdio de inflorescência por: grande, médio e pequeno. O primórdio de inflorescência por exemplo na figura abaixo, você consegue visualizar grandes primórdios de inflorescência (cacho).

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Figura 4 – Seção transversal mostrando o tamanho do primórdio de inflorescência (cacho). Foto: Roberto Anastácio.

Em um ano de condições normais, a análise de gema apenas irá confirmar a fertilidade típica da área, e o resultado não irá alterar as decisões da poda. Mas quando fertilidade tende a ser maior ou menor que o normal, esta análise pode dar ao produtor um aviso a tempo dele fazer as alterações necessárias na poda de produção. Usando esta análise, o produtor pode melhorar o potencial produtivo da planta já que não precisa deixar ramos extras. Assim, a planta não gasta em excesso com brotação e ainda pode reduzir os custos com poda e desbrota. Por outro lado, quando a fertilidade está baixa, o produtor terá a oportunidade de realizar procedimentos que garantam o maior número possível de cachos e consequentemente a produtividade esperada.

Segundo uma pesquisa realizada pelo Kearney Agricultural Center, estudando as variedades Perlette, Flame Seedless, Rubby Seedless e Thompson Seedless, no período de 1990 a 1993, identificou que o potencial de fertilidade variou cerca de 25% de um ano para o outro. Devemos lembrar que este percentual está intrínsicamente relacionado com a variedade em estudo.

Depoimento de consultor e produtor que utilizam esta ferramenta:

“A análise de gemas é uma boa ferramenta para ajustar melhor a poda, pois indica com mais segurança o posicionamento dos cachos no ramo a ser podado. Com isso pode melhorar a eficiência da poda, não necessitando podar um número de gemas desnecesssárias. Em consequência pode melhorar também na desbrota, para evitar gastos desnecessários. Economia de produtos para a indução de brotação. Com isto pode também reduzir perdas de reservas, em função de uma poda mais adequada”.

Augusto Prado (Consultor)

“A análise de gemas me permitiu reduzir muitas perdas, já que antes de usar essa técnica a poda era feita no “achismo”, ou seja, eu determinava o número de gemas dos ramos simplesmente achando que os cachos estariam concentrados até a 7° gema. Porém, com a chegada dessa técnica, eu podo sabendo exatamente onde há concentração de cachos nos ramos, ou seja, eu tenho convicção de que os cachos estão até a 7° gema. Assim sendo, eu reduzi perda de tempo, já que não preciso podar além do necessário, reduzi a perda de mão de obra, pois se podo menos, eu também desbroto menos e assim sobra trabalhador, e ainda ganho em qualidade porque se a planta gasta menos para brotar essa reserva é redirecionada aos brotos/cachos que ficarão. Enfim, se o analista for bem treinado, essa técnica de análise de gemas é um grande instrumento administrativo na mão do viticultor”.

Eder Ignácio de Souza (Produtor Rural)

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Fonte bibliográfica:

Agradecimentos:

Gostaria de agradecer a colaboração dos profissionais Patricia Fernanda e Roberto Anastácio na construção desse artigo. O apoio técnico de ambos foram cruciais para trazer fotos e este conhecimento até vocês.

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